Passaram-se dez anos desde o trágico dia 7 de janeiro de 2015, quando os irmãos Kouachi, extremistas jihadistas, invadiram a redação do jornal satírico Charlie Hebdo em Paris. O ataque resultou na morte de 12 pessoas, incluindo oito jornalistas e cartoonistas, e deixou cinco feridos. O atentado abalou a França e o mundo, simbolizando uma agressão direta à liberdade de expressão.
Amanhã de manhã, Paris presta homenagem às vítimas. Cerimónias oficiais contam com a presença do presidente Emmanuel Macron, da presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, e de vários membros do Governo.
Das 12 vítimas, 11 morreram dentro da sede do editorial e uma do lado de fora. Dois eram agentes policiais responsáveis pela segurança do prédio em virtude das ameaças que o editorial vinha recebendo de extremistas. O policial Franck Brinsolaro foi morto dentro do prédio, e o policial Ahmed Merabet, do lado de fora. Das outras 10 vítimas, 8 eram membros da equipe editorial do jornal. Eram estes 8, os cartunistas Charb, Cabu, Tignous, Honoré e Georges Wolinski, o economista Bernard Maris, a colunista e psicanalista Elsa Cayat e o corrector Mustapha Ourrad. Os outros dois eram o editor Michel Renaud convidado por Cabu e Frédéric Boisseau, empregado da Sodexo que trabalhava no local.
Este aniversário coincide com o início do julgamento de um cidadão paquistanês responsável por outro ataque, ocorrido em 2020, junto às antigas instalações do jornal. O agressor, que feriu gravemente duas pessoas com um cutelo, enfrenta acusações de tentativa de homicídio terrorista e conspiração criminosa.
Além disso, o dia é assinalado com o lançamento de uma edição especial do Charlie Hebdo. Esta edição comemorativa inclui 40 desenhos selecionados de um concurso internacional com o tema “Rir de Deus”. Riss, diretor do jornal e sobrevivente do ataque, reflete sobre a importância do humor: “O riso, a ironia e a caricatura são expressões de otimismo que ajudam a resistir.”
Uma década após o atentado, o debate sobre laicidade e liberdade de expressão continua a dividir a sociedade e a classe política francesa. Entre os líderes da Nova Frente Popular, coligação da esquerda, Fabien Roussel, do Partido Comunista Francês, é um dos apoiantes mais explícitos do Charlie Hebdo. Já figuras da ala mais radical, como Jean-Luc Mélenchon, fundador do partido França Insubmissa, criticam a linha editorial do jornal, acusando-o de se afastar dos seus valores originais. As críticas não vêm apenas da esquerda radical. A deputada ecologista Sandrine Rousseau afirmou não apreciar a publicação, que considera “sexista e, por vezes, racista”. Apesar das divergências, muitas vozes políticas concordam em homenagear as vítimas e defender os princípios da liberdade de expressão.
É impossível recordar o atentado ao Charlie Hebdo sem mencionar os acontecimentos que se seguiram. No dia seguinte ao ataque à redação, Amedy Coulibaly, outro jihadista relacionado com os irmãos Kouachi, matou uma agente policial em Montrouge. No dia 9 de janeiro, invadiu um supermercado kasher em Paris, fazendo reféns e assassinando quatro pessoas. No total, os ataques entre 7 e 9 de janeiro de 2015 tiraram a vida a 17 pessoas.
Dez anos depois, a França reafirma o compromisso com os valores de liberdade, igualdade e resistência ao obscurantismo. As homenagens de hoje não são apenas um tributo às vítimas, mas também uma reafirmação do direito de pensar, expressar e criticar livremente. A frase “Je suis Charlie”, que ecoou pelo mundo em 2015, mantém-se como símbolo universal da luta pela liberdade de expressão. E, como destaca Riss, “o desejo de rir nunca desaparecerá”.