
O deputado da Somme, François Ruffin, candidato declarado a uma possível primária da esquerda, deu um passo decisivo rumo às presidenciais de 2027 ao lançar, ontem a noite, as secções “Paris Debout!” e “Jeunes Debout!”.
A sessão pública decorreu ao final da tarde, no Espace Mas, no 13.º arrondissement de Paris, reunindo militantes e simpatizantes num auditório cheio, marcado pela energia de um candidato que parece agora decidido a estruturar-se para disputar, de facto, a liderança da esquerda francesa.
No seu discurso, François Ruffin não poupou ataques à extrema-direita, mas também não poupou a esquerda tradicional, acusando-a de falta de ousadia: “Não venceremos Le Pen e Bardella com água morna e reformas de catálogo. Num mundo que está a oscilar, não ganharemos com 57 livretos e 847 medidas tecnocráticas, mas sim com audácia.”
A intervenção, vibrante e ritmada, procurou marcar uma rutura com os programas extensos e difusos que, segundo ele, afastam os eleitores populares. Ruffin lançou ainda críticas diretas ao atual presidente: “A monarquia acabou! 62 400 euros por ano só para a maquilhagem de Macron e Brigitte…”
E atacou igualmente os benefícios vitalícios atribuídos aos antigos presidentes: “As vantagens vitalícias têm de acabar. Sarkozy custa-nos um milhão por ano, mesmo quando esteve na prisão.”
O deputado anunciou ainda que pretende propor uma “grande lei de separação entre o Dinheiro e o Estado”, que qualifica como o ponto de partida de um combate “entre democracia e oligarquia”.
O tom endureceu quando o tema passou para os paraísos fiscais e a fraude dos grandes patrimónios: “Todos os ultra-ricos fraudam, isso faz parte do jogo, até dá para rir. Não sou eu que o digo, é o Élie de Rothschild.” E François Ruffin prosseguiu com uma metáfora contundente: “Os ratos [os ultra-ricos] não deixam apenas o navio — roem-no. Por causa deles, estamos a afundar. Teremos de os pôr na linha.”
Um dos momentos mais aplaudidos da noite foi a mensagem dirigida aos cinco milhões de trabalhadores essenciais (auxiliares de saúde, cuidadores, trabalhadores do comércio, motoristas, entre tantos outros) que mantiveram a França a funcionar durante a pandemia de COVID-19. Ruffin prometeu um estatuto digno, com “salário, horário e carreira” definidos: “Desta vez, os últimos serão os primeiros.”
A reunião em Paris sinaliza assim uma viragem: o que era um movimento regional (Picardie Debout !) transforma-se agora numa força nacional (Debout !) que pretende disputar espaço no terreno da esquerda. François Ruffin, que durante anos rejeitou estruturas políticas formais, parece finalmente assumir o seu papel de candidato, com uma narrativa que mistura denúncia social, apelo popular e promessas de rutura.
Se o caminho até 2027 ainda é longo (faltam 506 dias), a noite de ontem mostrou, pelo menos, uma certeza: François Ruffin quer estar no centro do jogo, e a esquerda francesa terá de contar com ele.
Didier Caramalho
Presidenciais 2027: François Ruffin lança campanha e movimento sem se declarar candidato