« Em França somos portugueses, em Portugal somos franceses »
Filhos de emigrantes: « Associamos o português ao divertimento e o francês às preocupações ».
Encontro Europeu de Jovens Lusodescendentes trouxe a Cascais mais de meia centena de filhos de portugueses que herdaram dos pais o sotaque e o amor à terra. Vieram conhecer os « irmãos ». « Vivemos duas vidas, uma em casa, outra na rua », diz Patrícia Cabeço
Reportagem do DN, por Paula Freitas Ferreira
A iniciativa, da associação Cap Magellan, tem vários anos, mas pretende « relançar estes encontros que são muito importantes para as novas gerações de lusodescendentes », disse o presidente da Cap Magellan e vereador na câmara de Paris, Hermano Sanches Ruivo, nascido em Alcains, Castelo Branco, emigrante em França desde os cinco anos. Com ele, a Cascais, trouxe um dos filhos, Rafael, de 15 anos. « Vê lá se aprendes alguma coisa », diz, a sorrir.
Trata-se mesmo de aprender, uns com os outros, e de conhecer mais do Portugal dos pais, o país que todos estes jovens trazem no coração e no sotaque. Em três dias, vão falar sobre como estudar em Portugal e sobre a língua portuguesa, mas sobretudo conhecer mais e melhor a cidade e os outros lusodescendentes e portugueses que participam do encontro. Ao todo, são 53 jovens e chegaram não só de França, como do Luxemburgo, Suíça e Suécia.
« Vivemos duas vidas, uma em casa, outra na rua », diz Patrícia Cabeço, garantindo que todos já se habituaram a viver dessa forma. O lado português é sempre o da alegria: « Associamos o português ao divertimento e o francês às preocupações », admite.
Astrid Cerqueira, de 23 anos, amiga de Patrícia, é, como ela, voluntária na Cap Magellan, e concorda com a afirmação. Os pais são de Amarante, e os olhos brilham-lhe quando fala da terra « tão bonita » que lhe coube em herança.
Paris é: « Métro, boulot, dodo »
Esteve a estudar no Porto um ano, através do programa Erasmus, e sentiu-se pela primeira vez portuguesa « a sério ». « Nunca tinha vivido aqui, sem ser nas férias. Adorei. Gostava de viver em Portugal, mas é complicado encontrar trabalho », resume.
Em França, não há vales ou rios como estes, e as pessoas na rua não falam a língua dos pais. França não é Portugal. « A vida leva-se melhor aqui, em Paris é sempre a correr. « Métro, boulot, dodo » – « Metro, trabalho, dormir », é uma expressão que usamos muito, explica Patrícia Cabeço. Os lusodescendentes não atravessaram a fronteira a salto, mas olham para o país onde nasceram como o lugar da labuta e pouco mais.
A salto, para França, partiram os pais de Johann e Yannick Lopes, dois irmãos de 33 e 35 anos. São músicos profissionais, um tem um doutoramento em concertina e o outro é campeão de acordeão. Têm estudos superiores em Música, formação clássica e encantam-se constantemente com a « riqueza » que encontram nas terras dos pais: Alijó e Ponte de Lima. Habituaram-se a não ser de lado algum, mas como a música é universal, são « do mundo ».
« Em França somos portugueses, em Portugal somos franceses », contam, nota-se um bocadinho de mágoa na voz. « Somos mais portugueses na Sibéria e na Sardenha do que aqui », acrescenta um dos irmãos.
« Temos o património genético e artístico de Portugal », sublinham, mas é quando falam dos tantos sotaques portugueses que existem, dos vários « Minhos » dentro do Minho ou dos cantares que já serviram de tema de estudo de um deles, é que se percebe que são – e merecem que se diga – portugueses.