Amazónia: o pulmão da Terra está a arder

Parece ficção científica mas os danos são bem reais: como o pulmão da Terra está a sofrer.

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A floresta responsável por 20% do oxigénio que o mundo respira está em chamas, desaparece a uma velocidade assustadora, os danos à biodiversidade são irreparáveis e as populações indígenas estão em perigo. A Amazónia arde, o Brasil cheira a cinza e o governo de Jair Bolsonaro minimiza o problema – o presidente diz mesmo, mas sem o provar, que foram as ONG que atearam os fogos só para o prejudicar

Alfa/Expresso. Por SOFIA PERPÉTUA, NO RIO DE JANEIRO

A fumaça trouxe a noite, o Brasil cheira a cinza e destruição, eram três da tarde de segunda-feira quando o dia se tornou noite em São Paulo. O céu escureceu, acusou as cores de um céu de um futuro de ficção científica que se desenha cada vez mais real no Brasil de 2019. A Amazónia é longe mas está presente, é impossível ignorar que o pulmão do mundo está a arder quando a chuva é negra. A milhares de quilómetros a Amazónia continua a arder, vê-se do espaço.

As imagens da NASA (é vê-las AQUI) começaram a mobilizar a opinião pública mundial, mas depois de semanas a arder, os danos na floresta amazónica e no ar que se respira no planeta Terra podem ser já irreversíveis. A devastação causa uma grave crise climática, motivo suficiente para a menina da meteorologia da TV Globo mostrar um mapa de queimadas antes de dar as previsões de temperatura para o dia seguinte. Análises à água negra da chuva de São Paulo confirmam presença acima do normal de partículas resultantes das queimadas, efeitos da fuligem dos incêndios florestais.

O recorde é de 72.843 focos de incêndio no Brasil apenas em 2019, 82% a mais do que no mesmo período de 2018, metade desses fogos são na floresta Amazónia, mas Pantanal, Acre, Rondónia, Mato Grosso e Tríplice Fronteira registam também incêndios de grandes proporções.

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) acusou o avanço do corredor de fumaça em direção ao centro sul do país e a São Paulo. O físico Ricardo Galvão, ex-diretor do instituto, foi recentemente demitido por Bolsonaro após o governo ter acusado o instituto de fabricar os números do desmatamento. O INPE tinha alertado para um aumento de desmatamento de 88% em junho e 278% em julho, em comparação com iguais períodos de 2018. Bolsonaro chamou mentirosos aos dados do INPE.

“Nós usamos publicações científicas, não balela de Twitter”, disse Galvão, exonerado no início de agosto por Bolsonaro.

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A desflorestação e o desmatamento aumentam as terras disponíveis para o negócio agropecuário, mas Bolsonaro acusa as ONG. “O crime existe, e nós temos de fazer o possível para que esse crime não aumente, mas nós tiramos dinheiros de ONG. Dos repasses de fora, 40% iam para ONG. Não tem mais. Acabámos também com o repasse de dinheiro público. De forma que esse pessoal está sentindo a falta do dinheiro”, disse Bolsonaro esta quarta-feira quando questionado sobre o que se está a passar na Amazónia – e afirmou mesmo que são as ONG que estão a atear os fogos só para o prejudicar. “Então, pode estar havendo, sim, pode, não estou afirmando, ação criminosa desses ‘ongueiros’ [funcionários das ONG] para chamar a atenção contra a minha pessoa, contra o governo do Brasil. Essa é a guerra que nós enfrentamos”.

Apesar de não ter provas, o presidente do Brasil tem palpites, “o fogo foi tocado, pareceu, em lugares estratégicos”. “Há imagens da Amazónia toda. Como é que pode? Nem vocês teriam condições de todos os locais estar tocando fogo para filmar e mandar para fora. Pelo que tudo indica, foi para lá o pessoal para filmar e tocaram fogo. Esse que é o meu sentimento”. Acrescentou ainda que as ONG representam “interesses fora do Brasil” e acusou os governadores do norte do país de não ajudarem no combate aos fogos e de “não mexerem uma palha”, de forma a colocarem a culpa no governo federal.

O presidente do Brasil acrescentou que não se pode acreditar na Alemanha e na Noruega, após estes dois países terem cancelado as suas contribuições para o Fundo Amazónia devido às políticas de Bolsonaro e às tentativas de o governo alterar o funcionamento do fundo. O fundo bilionário está suspenso, as negociações paralisadas, entre 2008 e 2018 o fundo tinha captado 3,4 biliões de reais em doações.

O ministro do Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que o aumento de incêndios no Brasil deve-se ao tempo seco, ao vento e ao calor. Mais de 50 organizações não governamentais pediram terça-feira à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão que Salles seja investigado por improbidade administrativa, pela omissão do Ministério do Ambiente face à devastação da floresta amazónica. “O grau de devastação demonstra que as Unidades de Conservação da Amazónia vêm sendo desguarnecidas e com notícias de agentes intimidados em sua função precípua de fiscalização”, comunicaram em nota.

ONG como o Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, (PROAMB) ou a World Wide Fund Brasil (WWF) acusam Bolsonaro de irresponsabilidade e manobras de diversão, depois de terem sido acusadas pelo presidente de terem ateado os fogos. “É uma declaração leviana, irresponsável, diversionista do presidente. Quem ele acha que está enganando? Os dez municípios com maior foco de incêndio esse ano na Amazónia são os mesmos dez que têm o maior número de desmatamento. Só não vê quem não quer”, disse Raul Valle, diretor de justiça socioambiental da World Wide Fund Brasil.

No Twitter, Bolsonaro celebra esta quarta-feira o fim de séries LGBT já previamente aprovadas nas televisões públicas. Nas redes sociais estão a ser partilhadas milhões de hashtags sobre a Amazónia, #AmazonRainforest #PrayForAmazon, #PrayForAmazonas, algumas pessoas relembram que hashtags não apagam fogo nem impedem catástrofes globais.

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