Ataques em Cabo Delgado, Moçambique: Palma (onde está em construção um vasto projeto industrial de gás natural da empresa francesa Total) estará já sob controlo dos combatentes jihadistas – informa a cadeia TV5 Monde, com base na agência AFP. O mesmo indica o jornal Le Monde, com base na mesma fonte.
A cidade começou a ser atacada na quarta-feira, nos arredores de uma zona onde está em construção um grande projeto industrial (gás) da empresa francesa Total.
Não há por agora balanço de vítimas mas os ataques na região foram assinalados e confirmados desde quarta-feira.
Le Monde escreve em título: « Mozambique : des djihadistes prennent la ville de Palma, à proximité d’un projet gazier piloté par le groupe français Total ».
Já TV5 Monde escreve: « Attaque au Mozambique: Palma aux mains des jihadistes ».
Em Palma habitarão e trabalharão pessoas de diversas nacionalidades, incluindo portuguesas.
Em Portugal, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, disse hoje que um cidadão português resgatado em Palma, Moçambique, terá ferimentos “menos graves” do que inicialmente previsto e afirmou estar a acompanhar, com o Governo, o evoluir da situação.
Leia aqui uma reportagem da agência Lusa publicada há minutos pela agência portuguesa:
REPORTAGEM: Moçambique/Ataques: Entre o desespero e a fuga, somam-se relatos do terror em Palma
A tia de Arnaldo Júlio, 27 anos, foi degolada no ataque de quarta-feira a Palma, norte de Moçambique, conforme lhe relatou o tio, ao telefone, quase em tempo real.
« A minha esposa… degolaram-na agora, na machamba [horta] » – estas foram as últimas palavras que Arnaldo ouviu do familiar, que fugia e tentava esconder-se numa cova, pedindo ao sobrinho que não ligasse mais, com medo de que o telemóvel o denunciasse perante os insurgentes armados que passavam, ao invadir a vila.
Seguiu-se o corte nas comunicações móveis, que perdura até hoje, e Arnaldo não soube mais nada de dois tios, um residente na vila e outro contratado por uma das empresas que trabalham para o consórcio liderado pela petrolífera Total.
Arnaldo mora em Pemba, capital provincial de Cabo Delgado, 250 quilómetros a sul de Palma e da península de Afungi.
Três dias após o ataque à sede de distrito ouve-se o tom de desespero por parte de quem tem familiares a residir na zona e a trabalhar para os projetos de gás de Cabo Delgado.
Arnaldo emociona-se quando diz que ainda esperava ver os seus familiares.
“A minha esperança é que eles voltem vivos para Pemba, principalmente o meu tio que viu a esposa a ser degolada. Não sei o que aconteceu com ele”, afirma.
A cova de que o tio lhe falou era um esconderijo previamente preparado pelo casal, uma medida de quem vive numa zona de risco.
O relato do jovem junta-se a outros retratos de terror ouvidos pela Lusa desde quarta-feira.
Um residente que fugiu de Palma, juntamente com outros, disse na sexta-feira que são visíveis corpos de adultos e crianças assassinados nas ruas da sede de distrito.
Segundo o seu relato, ele e outras pessoas foram avançando às escondidas, de rua em rua, evitando as zonas onde se ouvia tiroteio, para assim saírem do perímetro de Palma, chegando a Quitunda, aldeia construída de raiz junto ao recinto do projeto de gás, na quinta-feira à tarde.
Um número incalculado de pessoas está desde quarta-feira a fugir para a península de Afungi.
Um grupo mais restrito, de cerca de 200 cidadãos de diferentes nacionalidades, refugiou-se no hotel Amarula, de onde muitos foram sendo resgatados por terra e mar para a área controlada pela petrolífera Total.
Uma das caravanas foi atacada na noite de sexta-feira e pelo menos sete pessoas morreram, mas fontes que acompanham as operações admitem que o número de baixas esteja subavaliado.
Houve ainda muitos feridos no incidente e um deles é um cidadão português, posteriormente transferido por via aérea de Afungi para Pemba.
O ataque desencadeado na quarta-feira e que hoje entrou no quarto dia é o mais grave junto aos projetos de gás após três anos e meio de insurgência armada à qual a sede de distrito tinha até agora sido poupada.
Fontes contactadas pela Lusa disseram que Palma continuou hoje ocupada por rebeldes armados, enquanto prosseguiam operações para evacuar a vila e também a zona dos projetos na península de Afungi.
O Ministério da Defesa moçambicano anunciou na manhã de quinta-feira que estava no terreno a reprimir a ofensiva rebelde, mas não voltou a dar mais informações.
A Lusa tem tentado desde quarta-feira obter esclarecimentos sobre a situação da por parte da petrolífera Total, mas não obteve resposta.
A violência que grassa desde outubro de 2017 está a provocar uma crise humanitária com quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes.
Algumas das incursões foram reivindicadas pelo grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico (EI) entre junho de 2019 e novembro de 2020, mas a origem dos ataques continua sob debate.
Ouça esta crónica da Alfa, de Ricardo Figueira, no dia 25/03:
Tragédia e massacres num país irmão. Não esqueçamos Moçambique. Crónica