Artigo de Miguel Dantas in publico.pt
Bruno de Carvalho, ex-presidente dos “leões”, é acusado de 97 crimes de terrorismo. A ele juntam-se 43 arguidos, responsabilizados pelas agressões sofridas pelos jogadores e equipa técnica em Maio de 2018.
Meia centena de homens encapuzados, agressões e ameaças, balneário destruído, rescisões por justa causa, uma final da Taça de Portugal perdida e um presidente destituído: a novela que envolveu o Sporting na recta final da época 2017-18, e cujos efeitos ainda se fazem sentir, chega esta segunda-feira a julgamento.
Será no Tribunal de Monsanto, em Lisboa, que os 44 arguidos da invasão à academia de Alcochete responderão pelos crimes de que são acusados pelo Ministério Público. Destes, apenas Nuno Mendes, líder da claque Juventude Leonina conhecido como “Mustafá”, se mantém em prisão preventiva.
A investigação foi da responsabilidade da procuradora Cândida Vilar, que recebeu uma punição por falta de zelo — ao deixar clara a ideia de que tinha sido forçada a apressar a acusação — e foi ainda alvo de um processo disciplinar, pelo tom agressivo que terá usado durante os interrogatórios.
Bruno de Carvalho é, sem grandes margens para dúvida, o arguido mais mediático do processo. Foram as agressões em Alcochete que espoletaram o afastamento do então presidente, que culminou com a sua destituição pouco mais de um mês após o incidente.
O ex-presidente é acusado de ter sido autor moral do ataque, estando acusado de 40 crimes de ameaça agravada, 19 de ofensa à integridade física qualificada, 38 de sequestro, ilícitos que, no entendimento do Ministério Público, neste caso, configuram crimes de terrorismo, puníveis com pena de prisão de dois a dez anos. Bruno de Carvalho é ainda acusado de um crime de detenção de arma proibida agravado.
A investigação concluiu que as críticas públicas do ex-presidente aos jogadores no Facebook serviam para “determinar os adeptos à prática de acções violentas contra os jogadores e a equipa técnica, o que o arguido Bruno de Carvalho pretendia”, pode ler-se no despacho final.
Em resposta a estas imputações, Bruno de Carvalho arrolou 22 testemunhas, nas quais se encontram nomes como o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, Pinto da Costa e Sousa Cintra. A defesa do ex-presidente solicitou também que o ataque à academia fosse reconstituído em tribunal, visto que a zona dos balneários — onde se deram as agressões — não é abrangida pelo sistema CCTV [circuito de videovigilância interna].
Os restantes arguidos são, na grande maioria, membros da claque Juventude Leonina — grupo organizado com o qual o Sporting cortou recentemente relações. Nuno Mendes, conhecido como “Mustafá” e líder do grupo; Fernando Mendes, antigo líder da Juve Leo que foi, entretanto, libertado por motivos de saúde; e Bruno Jacinto, ex-oficial de ligação aos adeptos, estão acusados do mesmo número de crime que o ex-presidente.
As investigações afirmam que os planos para agredir os jogadores na academia tiveram início dois dias antes, a 13 de Maio, após a derrota do Sporting frente ao Marítimo, na Madeira, que ditou o afastamento da pré-eliminatória da Liga dos Campeões. Em grupos criados no Whatsapp, os arguidos insultavam os jogadores pelo mau desempenho.
Nas mensagens que constam no despacho final, “Mustafá” terá garantido aos restantes membros de que a invasão a Alcochete tinha recebido “luz verde” de Bruno de Carvalho, que terá dado a indicação de que Jorge Jesus estaria de saída do clube. “Já falei com o presidente e ele disse-me ‘desta vez façam o que quiserem aos jogadores”, diz uma das mensagens.
As agressões atingiram praticamente todo o plantel e equipa técnica do Sporting. O avançado holandês Bas Dost, agredido na cabeça, teve de ser assistido pelos médicos dos “leões”. O preparador físico Mário Monteiro sofreu queimaduras na mão e na barriga, após ter sido atingido com uma tocha. O técnico Jorge Jesus também terá sido alvo de agressões.
Na mesma semana do ataque à academia, o Sporting foi derrotado pelo Desp. Aves no Jamor. Dias depois da derrota na final da Taça, vários jogadores rescindiram unilateralmente o contrato com o clube, denunciado ameaças e assédio, que tornavam impossíveis a continuação em Alvalade. Alguns dos que rescindiram contrato voltaram atrás na decisão, enquanto outros não vestiriam novamente as cores do Sporting.
Alfa/Público