O poder político estilhaçou-se e as sequelas da crise contaminam o sistema judicial. O caminho do caos é uma má notícia para os brasileiros, mas uma boa nova para a extrema-direita de Bolsonaro.
Depois da tormenta política, o Brasil experimenta agora os sintomas de anarquia no seu sistema judicial. As suspeita de um golpe para afastar o PT eleito em 2015 persiste, a figura mais popular do regime, Lula da Silva, está na prisão, as sondagens indicam a possibilidade de um candidato da extrema-direita, Jair Bolsonaro, chegar ao poder e, soube-se agora, o sistema judicial entrou num devaneio que trava todas as noções de responsabilidade, hierarquia e jurisprudência. Manter viva uma democracia com o poder político carente de legitimidade é um drama; juntar a esse drama um poder judicial contaminado pela suspeita de sectarismo torna o cenário do Brasil muito mais preocupante e sombrio.
O mesmo não se pode dizer do despacho do desembargador de plantão que aceitou o habeas corpus de deputados do PT apresentado ao tribunal esta sexta-feira. Como pode ter um magistrado esquecido os acórdãos de tribunais superiores? Pode a partir do momento que se sabe que é um ex-militante com 20 anos do PT e foi alto funcionário nos governos de Dilma. Não é por isso a liberdade subjectiva mas consciente em interpretar o processo de Lula que está em causa, mas a manifestação de que a magistratura entrou na disputa entre os apoiantes de Lula e os do juiz Sérgio Moro.
Cada dia que passa, o Brasil parece dar novos passos para o precipício. A sua sociedade é incapaz de estabelecer os consensos mínimos da democracia. O seu sistema institucional dá sinais de se afundar no sectarismo que esquece a lei, o bom senso e o sentido de Estado. Já se sabia que a prisão de Lula e o seu afastamento das presidenciais levaria o país para a beira de um ataque de nervos. Não se esperava no entanto que a máquina institucional mostrasse brechas assim. O Brasil precisa de diálogo e sensatez para se reerguer e assumir o seu papel no mundo. A cacofonia política e judicial só serve para amplificar a descrença e o desespero e, por extensão, o discurso fascizante de Bolsonaro.