Estátua de Pedro Álvares Cabral incendiada no Rio de Janeiro durante um protesto contra um projeto que retira direitos aos povos indígenas
Alfa/MadreMedia/Lusa/Sapo
O monumento fica localizado no Largo da Glória, na zona Sul do Rio, sendo que o acto de vandalismo foi motivado pela discussão em curso sobre o futuro das demarcações de terras indígenas no Brasil.
De acordo com o jornal O Globo, o monumento, que ficou danificado pelas chamas, tinha afixados cartazes com a frase « Marco Temporal é genocídio. PL [Projeto de Lei] 490 não ». Em causa estão projetos sob análise do Congresso brasileiro e do Supremo Tribunal Federal (STF) que podem retirar direitos aos povos nativos do Brasil.
A tese do chamado ‘marco temporal’ defende que povos indígenas brasileiros só podem reivindicar terras onde já viviam em 5 de outubro de 1988, dia em que entrou em vigor a atual Constituição do país. Ou seja, é necessária a confirmação da posse da terra no dia da promulgação da Constituição Federal, mesmo que os povos em causa tenham sido afastados das terras pelo uso da violência.
O monumento de Pedro Álvares Cabral em causa, foi inaugurado em maio de 1990, durante a comemoração dos 400 anos desde a chegada do navegador ao Brasil em 1500.
Tese sobre demarcação de terras indígenas é inconstitucional
O Ministério Público (MP) brasileiro considerou hoje inconstitucional o Projeto de Lei (PL) 490, que visa consolidar em lei a polémica tese que retira direitos aos povos indígenas sobre a demarcação das suas terras.
« Para o MP brasileiro, são inconstitucionais quaisquer medidas que enfraqueçam a proteção às terras indígenas prevista no artigo 231 da Constituição, violem direitos fundamentais e ofendam o direito adquirido dos povos indígenas às terras tradicionalmente ocupadas », destacou o procurador Paulo de Tarso Oliveira.
A manifestação do MP foi feita durante uma audiência pública no Senado. Além de representantes do MP, participaram no evento lideranças indígenas e representantes de organizações de investigação e de defesa de direitos socioambientais.
« O PL 490 e demais iniciativas que visam suprimir ou reduzir os direitos indígenas ofendem normas internacionais de direitos humanos, por violação à autonomia dos povos indígenas e ao direito ao usufruto exclusivo das suas terras, e pela contrariedade ao princípio da vedação ao retrocesso social e ao direito à consulta livre, prévia e informada », frisou ainda o Ministério Público em comunicado.
De um lado, a bancada ruralista e instituições ligadas à agropecuária defendem a tese. Do outro, povos indígenas temem perder direito a áreas em processo de demarcação.
Nesse sentido, milhares de indígenas de diferentes regiões do Brasil encontram-se acampados em Brasília, capital do país, desde domingo, para tentar travar a perda de direitos.
“A minha experiência na Amazónia tem revelado que todas essas proposições legislativas vêm a reboque de uma dinâmica de violência e de ameaças fomentadas – por ação ou por omissão – pelo próprio Estado Brasileiro, e isso é de uma violência absurda”, alertou ainda Oliveira.
O representante do MP acrescentou que há uma relação direta entre as manifestações políticas de agentes do Executivo e o aumento da violência contra os indígenas.
O Brasil tem, sob análise, 237 pedidos de demarcação de terras indígenas. De acordo com a legislação brasileira, a demarcação estabelece claramente as áreas que pertencem aos povos indígenas, conferindo-lhes segurança jurídica sobre o direito coletivo em relação aos territórios, realçou a organização não governamental (ONG) Human Rights Watch, alertando que muito pedidos de demarcação estão pendentes há décadas.
Atualmente, vivem mais de 900 mil indígenas no Brasil, de 305 povos distintos, que falam mais de 180 línguas, de acordo com dados oficiais.