Em Arcos de Valdevez o vira roda todos os domingos, quer “chova ou faça sol”

Todos os domingos, à tarde, dezenas de pessoas juntam-se no centro de Arcos de Valdevez para dançar em ‘roda’, ao som da concertina, das castanholas e do reco-reco, 22 dezembro 2019. (ACOMPANHA TEXTO DIA 26 DEZEMBRO) ESTELA SILVA/LUSA

Em Arcos de Valdevez as tardes de domingo são passadas nas ruas do centro da vila, em ‘roda’, ao som da concertina, das castanholas e do reco-reco, bailando-se o vira durante « horas seguidas », quer « chova, quer faça sol ».

O movimento espontâneo começou « tímido » há quase década e meia. Nos últimos anos, ganhou dimensão e atrai dezenas de pessoas, não só de Arcos de Valdevez como dos concelhos vizinhos do distrito de Viana do Castelo, de Braga e até da Galiza.

 

São designadas por ‘rodas’ porque no centro ficam os tocadores de concertina a que se juntam os bailarinos, dançando em círculo, aos pares. A roda vai crescendo à medida que novos pares se juntam, ao ritmo do marcador, o dançarino que vai indicando os passos e o sentido que a roda deve tomar.

O « gosto » pelo folclore e a « alegria » que o convívio proporciona junta pessoas de todas as idades ao som das Chulas e das melodias da Cana Verde, das mais antigas danças populares das aldeias do Alto Minho.

« É uma alegria total, não há dores que me cheguem », diz Fernando Viana, que aos 78 anos encontrou nas ‘rodas’ que se realizam nas 52 semanas do ano, espontaneamente, a forma de ocupar a solidão.

Viúvo há um ano e com os filhos criados – um emigrante no Canadá, outro a residir em Vila do Conde (Porto)-, Fernando Viana não perde uma ‘roda’.

« Gosto imenso. Danço durante horas todos os domingos », afirmou.

No seio das ‘rodas’ já se fizeram casamentos, nasceram novas amizades e curam-se as « maleitas » da idade.

« É um divertimento, mas também uma fisioterapia », confessa Leonor Nogueira. A doméstica de 71 anos é uma das impulsionadoras do movimento que nasceu há cerca de 14 anos quando desafiou José Monteiro, o amigo tocador de concertina e cantador ao desafio.

« Começou por ser brincadeira, num grupinho », para se transformar numa ‘roda’ « enorme », com « gente de todo o lado » e durante « todo o ano, quer chova, quer faça sol ».

« Dançam a tarde toda », adiantou, enquanto ultima os preparativos da mesa de Natal montada no interior da tenda que a Câmara local mandou instalar para servir de abrigo, nos dias de inverno mais rigoroso.

O repasto, com as iguarias típicas da região, confecionadas pelos participantes da ‘roda’, servirá para repor energias numa tarde de dança que começa pelas 14:30 e termina ao cair da noite.

No inverno, como « escurece mais cedo », a ’roda’ dura até cerca das 19:00, mas no verão « só o cansaço vence tocadores, cantadores e bailarinos », pondo termo à festa que acontece em pleno Campo do Trasladário.

Não saber dançar não serve de desculpa para ficar fora da ‘roda’: « Quem não sabe, aprende aqui », atira José Monteiro, de 79 anos.

O tocador de concertina não troca as ‘rodas’ por outra forma de lazer e mesmo quando ainda trabalhava, como motorista de camiões internacionais, aproveitava « todos os bocadinhos » para tocar e cantar ao desafio.

« Gosto disto, quando estou aqui estou sempre bem », observou.

José e Leonor nunca pensaram que a « brincadeira » iniciada há 14 anos ganhasse a dimensão que hoje tem. A Câmara de Arcos de Valdevez vai apoiando os pedidos dos organizadores, interessada em « preservar as tradições » e atenta ao impacto que as ‘rodas’ têm hoje na animação local.

A dimensão do movimento espontâneo justificou, desde há uns anos, a integração no programa das festas em honra de Nossa Senhora da Lapa. Em agosto, transformam-se num dos números emblemáticos daquela romaria.

Durante as festas, « as rodas mudam de local », tomam conta da principal avenida da vila e desfilam, durante horas, juntando « a população, os emigrantes e visitantes ».

De Arcos de Valdevez a tradição passou para o município vizinho de Ponte da Barca, a apenas quatro quilómetros de distância. Ali o vira dançado em roda acontece aos sábados e domingos no Largo do Curro, onde o Câmara também mandou instalar uma tenda para resguardar dançarinos e tocadores.

Também em Ponte da Barca, a ‘roda’ que acontece todo o ano muda, em agosto, com a Romaria de São Bartolomeu, engrossando com a chegada dos emigrantes.

Alfa/Lusa

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