Emigrantes em dúvida para o verão. Quarentenas no regresso e surto em Lisboa estão a travar milhares de emigrantes portugueses
Emigrantes portugueses queixam-se de falta de informação e receiam vir a Portugal nas férias. Quarentenas obrigatórias e informações falsas estão a deixar as comunidades preocupadas e a cancelar viagens
Alfa/ Expressso. – TEXTO CRISTINA PERES E LILIANA VALENTE. FOTO NUNO BOTELHO (Leia a versão original deste trabalho no expresso, edição semanal)
Filipe Santos vive em Inglaterra e comprou o bilhete de regresso das férias através de Espanha, para evitar a quarentena quando voltar ao trabalho. Sofia C. vive na Alemanha e este ano, ao fim de 30 anos em Berlim, decidiu não vir a Portugal. João Ramos trabalha em Bruxelas e já viu a Bélgica mudar tantas vezes de posição em relação a Portugal que está sempre a mudar as viagens e não sabe se não terá de adiar de novo os planos. Nas comunidades de emigrantes portugueses reina a confusão. A informação oficial não está a chegar — apesar de o Governo dizer que o faz pelos sites dos consulados e do portal das comunidades — e proliferam nas redes sociais artigos falsos que estão a deixar as centenas de milhares de portugueses que vivem no estrangeiro e que todos os anos vêm a Portugal à beira de um ataque de nervos. Além dos turistas, também os portugueses que ajudam a animar as economias locais podem falhar neste verão.
“Estamos muito preocupados por causa das incertezas. As pessoas têm menos receio do contágio do que de serem obrigadas a fazer 14 dias de quarentena no regresso, o que as impede de voltarem ao trabalho depois das férias”, diz ao Expresso Pedro Rubio, presidente do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Bélgica. Para este verão, Portugal já perdeu grande parte do turismo, mesmo que residual, mas agora há milhares de portugueses que também têm dúvidas ou não podem vir, sobretudo por causa das quarentenas obrigatórias.
Tem sido através de grupos de Facebook e de WhatsApp que tem circulado informação, que muitas vezes não é bem compreendida ou não está correta (como dizer que Portugal está com as fronteiras fechadas), o que “gera muitas confusões e ansiedade”, diz Pedro Rubio. “Há uma imagem falsa que corre nas comunidades, e não só, e muitos portugueses não estão confiantes de ir até Portugal”, admite ao Expresso o deputado do PS Paulo Pisco, que esteve em Paris a falar com emigrantes.
A circulação de informação já é difícil em tempos normais — agora está a ser mais. No Reino Unido, um grupo de portugueses que mantêm contacto por WhatsApp conta que não recebeu qualquer informação dos consulados ou da embaixada e que agora espera para ver o que é decidido no dia 27, quando o Governo de Boris Johnson reavaliar a decisão. Esses portugueses vão marcar as férias em cima da hora, até porque não sabem os voos que podem ser cancelados. O site da Embaixada de Portugal no Reino Unido parou em abril. Não tem qualquer informação sobre que condições devem os portugueses que estão naquele país seguir para quando vierem (ou quiserem vir) de férias.
Governo remete para informação nos consulados, além dos turistas, também os emigrantes podem falhar no verão
O Governo diz que está atento à situação, que tem dotado os portugueses “de informação atualizada e rigorosa” e que tem transmitido a ideia “de que não há qualquer impedimento a que os cidadãos nacionais residentes no estrangeiro viajem para Portugal”, responde ao Expresso a secretária de Estado das Comunidades, Berta Nunes. “Temos insistido em que são muito bem-vindos, que os esperamos, que essa é uma viagem segura e podem vir sem receio, cumprindo as normas de segurança”, acrescenta. Contudo, o problema para os portugueses não está a ser sobre a entrada em Portugal, mas sobre o regresso aos países de origem.
Para preparar a vinda a Portugal, o MNE preparou “perguntas frequentes ou folhetos informativos” e remete para os “postos consulares, que são um canal de comunicação fundamental que, além de direcionarem os cidadãos para estas informações, estão em constante contacto com as autoridades locais”, acrescenta a governante. O último folheto explica as normas que têm de ser seguidas para entrar em Portugal, mas não há qualquer informação sobre as restrições dos países de origem, nomeadamente dos países que obrigam a quarentena.
Há oito países que impedem a entrada a partir de Portugal e seis com restrições, alguns deles, como o Reino Unido, com importantes comunidades portuguesas. “Há mesmo uma guerra no turismo, que era um balão de oxigénio para a economia. Portugal era o país que, à partida, tinha melhores condições para o turismo neste verão, mas todos os países querem roubar os turistas que viriam para cá”, diz Paulo Pisco. António Costa considerou “manifestamente injusta” a colocação de Portugal nas listas negras e apontou o dedo à União Europeia. “Há uma área onde a UE tem falhado, que é a de haver um critério uniforme quanto às fronteiras internas. Há países que foram recentemente colocados em listas vermelhas não porque tenham uma grande incidência da pandemia, mas porque tinham colocado outros em lista vermelha. Se começamos todos a agir em retaliação, vamos estar todos em listas vermelhas”, disse.