França a pé. Idade da reforma agrava greve

Governo cedeu, mas idade da reforma agrava greve geral. Primeiro-ministro Édouard Philippe anunciou concessões na revisão do sistema das reformas, mas quando evocou a “idade de equilíbrio aos 64 anos”, mesmo os sindicatos moderados decidiram entrar no movimento.

Alfa/Expresso Diário (última edição). Por Daniel Ribeiro (leia a versão original deste artigo, com fotos, em expresso.pt)

Há manifestações quotidianas em toda a França e, devido à greve geral, viajar nos transportes públicos é impossível desde há uma dezena de dias.

Nas estradas à volta das grandes cidades, os engarrafamentos contam-se em centenas de quilómetros e nas estações de metro e de comboios verifica-se um caos constante. Em Paris, também quase sem autocarros, só se veem filas intermináveis de automóveis e de milhares de pessoas a circular a pé, nos passeios, de manhã até à noite.

A greve provoca exasperação, tumultos e múltiplos conflitos entre utentes nos cais das gares, onde as pessoas se amontoam como sardinhas enlatadas em espaços demasiado exíguos, incapazes de acolher toda a gente. Os automobilistas apitam sem cessar e Paris perdeu a imagem romântica que desde sempre lhe esteve ligada. À noite, famosos cabarets e bares estão às moscas nos bairros mais frequentados por turistas, como no Quartier Latin ou nos Campos Elísios. Durante o dia, as lojas finas não têm clientes e os hotéis de luxo comunicam anulações alarmantes de reservas para a época festiva do fim do ano.

No entanto, apesar destes reais problemas no comércio e da crispação das pessoas – algumas disseram ao Expresso demorar, desde há uma semana, seis horas por dia para ir e regressar do trabalho – mais de 50% dos franceses continuam a apoiar a greve geral contra a revisão do sistema de cálculo das pensões de reforma.

É este aspeto – o apoio popular à greve, registado pelas sondagens – que está a inquietar a Presidência e o Governo. Na passada quarta-feira, o Primeiro-ministro, Édouard Philippe, tentou acalmar as coisas, anunciou diversas concessões sobre os regimes especiais de reforma, sobre as particularidades dos assalariados nos ramos da saúde, do ensino ou dos agricultores e flexibilidade e garantias para a entrada em vigor do futuro regime universal por “pontos”.

Mas, ao mesmo tempo, Philippe agudizou a crise com uma curta frase sobre a chamada “idade de equilíbrio aos 64 anos” que, na prática, porá fim ao atual regime de partida para a reforma aos 62 anos. A noção da “idade de equilíbrio” significa que os assalariados apenas terão uma reforma plena e sem penalizações se trabalharem até aos 64 anos.

A introdução desta noção “financeira” no debate sobre as reformas irritou todos os grevistas e levou o Governo a perder o mais importante dos seus possíveis aliados – a principal central sindical do país, a reformista CFDT, que também defende o sistema universal de cálculo das pensões por pontos e não integrava até agora a “intersindical” que decretou a greve.

Laurent Berger, líder da CFDT e próximo do Presidente Emmanuel Macron, disse que Philippe ultrapassou a “linha vermelha” e apelou à participação nas manifestações nacionais, designadamente na próxima terça-feira, dia 17.

Sem interlocutores para negociar e com os sindicatos todos unidos pela primeira vez desde há vários anos num movimento de protesto, o Governo vai certamente ter de ceder de novo, designadamente sobre a “idade de equilíbrio”. Sob pena de ver o país paralisado durante as festas de Natal e de contrariar os objetivos de Macron, que desejava entrar na segunda fase do seu mandato como um reformista e não como um Presidente que só provoca duras e longas crises sociais no país.

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