
As Bolas de Berlim são hoje um dos símbolos mais doces do verão português. Encontram-se de norte a sul, carregadas pelos vendedores de praia e irresistíveis com o seu recheio cremoso e o açúcar polvilhado. No entanto, poucos sabem que este doce tão associado a Portugal nasceu, na verdade, na Alemanha. A sua chegada ao nosso país é uma história de fuga, sobrevivência e adaptação que acabou por criar uma tradição única.
A chegada a Portugal (1935)
Tudo começou a 6 de outubro de 1935, quando o navio Kap Arcona atracou no porto de Lisboa. A bordo vinha a família Davidsohn, que deixava Berlim para fugir ao antisemitismo nazi. Procuravam segurança e uma nova vida, longe da perseguição que se intensificava na Alemanha.
O pai era consultor de arte, a mãe engenheira química. Nenhum dos dois pensava em trabalhar na área da pastelaria. Em Lisboa, abriram uma loja de relógios, acreditando que poderiam começar de novo.
Uma mudança forçada pela guerra
Com o rebentar da II Guerra Mundial, a economia portuguesa ressentiu-se e o negócio de relojoaria começou a perder clientes. Perante as dificuldades, a mãe decidiu recorrer a um conhecimento que trazia da sua terra natal: a confeção das famosas Bolas de Berlim. Começou a fazê-las em casa e a vendê-las na rua e sobretudo junto da comunidade Alemã e os ricos refugiados judeus que se tinham instalado na « Costa do Sol » na região da linha de Cascais, sem imaginar que estava a dar início a um novo capítulo na gastronomia portuguesa.
Diferenças da receita original alemã
Na Alemanha, as Bolas de Berlim — conhecidas como Berliner — eram tradicionalmente recheadas com compota de frutos vermelhos. Mas em Portugal, rapidamente se adaptaram ao gosto local. O recheio passou a ser de doce de ovos, um creme rico e suave que conquistou o paladar dos portugueses.
O segredo do sucesso
A massa fofa, frita até atingir um tom dourado, polvilhada com açúcar e recheada generosamente tornou-se um prazer irresistível. O sabor, aliado à textura, ajudou a transformar este doce num verdadeiro clássico.
Bolas de Berlim e a Praia: Uma Tradição Portuguesa
Vendedores ambulantes, muitas vezes carregando cestos cheios e protegendo o recheio do calor, popularizaram a imagem que hoje todos associamos ao verão.
Nas areias, os pregões chamativos e a frescura do creme tornam as Bolas de Berlim quase impossíveis de resistir. Em poucos lugares do mundo este doce é tão fortemente associado à praia como em Portugal.
A mistura entre o doce e o salgado
Antes de mais, é preciso ter em conta que, na praia, depois de um mergulho no mar, fica um travo salgado na boca e, por isso, um bolo doce sabe ainda melhor. É este contraste de sabores que produz o apetite pela bola de Berlim.
O formato redondo
O formato redondo também é importante. Já que é (quase) possível comer este bolo sem sujar as mãos. Embrulhado no guardanapo ou ainda dentro de um saco de papel, a bola torna-se simples de comer.
Curiosidades sobre as Bolas de Berlim
- Origem do nome: vêm da cidade de Berlim, onde eram chamadas Berliner Pfannkuchen.
- Doce sazonal: apesar de disponíveis todo o ano, o consumo dispara no verão.
- É o terceiro bolo mais consumido em Portugal, Depois do pastel de nata e do croissant que leva a medalha de prata, a bola de Berlim é o terceiro bolo mais consumido pelos portugueses. Em média, são vendidas mais de 250 mil bolas por dia.
- Presença internacional: versões semelhantes existem noutros países, mas a portuguesa é única pelo recheio de doce de ovos.
As Bolas de Berlim são portuguesas?
Não. A receita é de origem alemã, mas adaptou-se ao gosto português e ganhou identidade própria.
Porque se comem mais na praia?
A tradição começou no pós-guerra, quando vendedores ambulantes descobriram nas praias da Costa do Sol — especialmente na linha de Cascais, frequentada pela comunidade alemã e por ricos refugiados judeus — um ponto de venda ideal. O ambiente cosmopolita e a elevada afluência de turistas criaram o cenário perfeito para transformar essa prática num verdadeiro costume da região.
Qual a diferença entre a versão alemã e a portuguesa?
A alemã é recheada com compota, enquanto a portuguesa usa doce de ovos.
A história das Bolas de Berlim em Portugal é uma lição de resiliência e de como a gastronomia pode nascer de circunstâncias improváveis. De um doce alemão de inverno, passou a ser um símbolo do verão português, inseparável da imagem das praias e das férias. Hoje, cada dentada traz consigo não apenas um sabor único, mas também uma história de coragem e adaptação.