Portugal. Perdão de dívidas e financiamento: reparar consequências do colonialismo

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, durante a leitura da mensagem ao país, a propósito da realização das eleições legislativas 2024, no Palácio de Belém, em Lisboa, 09 de março de 2024. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Perdão de dívidas e financiamento podem ser formas de reparar consequências do colonialismo

O Presidente da República defendeu hoje que Portugal deve liderar o processo de assumir e reparar as consequências do período do colonialismo e sugeriu como exemplo o perdão de dívidas, cooperação e financiamento.

« Sempre achei que pedir desculpa é uma solução fácil para o problema. Peço desculpa… nunca mais se fala nisso. Assume-se a responsabilidade por aquilo que de bom e de mau houve no império. O assumir significa, de facto, isso », disse Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas, à margem da inauguração do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade, em Peniche.

A sugestão de que Portugal assumisse responsabilidades por crimes cometidos durante a era colonial tinha sido deixada pelo chefe de Estado durante um jantar na terça-feira com correspondentes estrangeiros em Portugal, em que o Presidente propôs o pagamento de reparações pelos erros do passado.

Instado a esclarecer as declarações feitas na altura, o Presidente da República sublinhou que, ao longo da sua presidência, tem defendido que Portugal tem de « liderar o processo » em diálogo com esses países.

« Não podemos meter isto debaixo do tapete ou dentro da gaveta. Temos obrigação de pilotar, de liderar este processo, porque se nós não o lideramos, assumindo, vai acontecer o que aconteceu com países que, tendo sido potências coloniais, ao fim de x anos perderam a capacidade de diálogo e de entendimento com as antigas colónias », alertou.

Para tal, Portugal tem de ter « formas de reparar » as consequências do colonialismo, exemplificando com o perdão de dívidas, a cooperação, a concessão de linhas de crédito e de financiamento que, disse, têm sido estabelecidos.

Questionado pelos jornalistas, o Presidente da República defendeu que o atual Governo deveria continuar com o processo de levantamento dos bens patrimoniais das ex-colónias em Portugal, iniciado pelo anterior Governo, para posteriormente devolvê-los.

« É uma questão que tem que ser tratado pelo novo Governo, em respeito com as funções executivas do Governo e tem que ser tratada em contacto com esses estados », disse.

Além do património das ex-colónias, Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que « está por resolver » também os problemas dos antigos combatentes e dos « espoliados » dos seus bens nas ex-colónias e obrigados a regressar a Portugal.

No mesmo jantar com jornalistas correspondentes, o Presidente da República já tinha sublinhado que os crimes cometidos durante a era colonial, incluindo massacres, tiveram custos e lembrou que algumas ações nunca foram punidas e bens saqueados nunca foram devolvidos.

As declarações do chefe de Estado provocaram reações imediatas de alguns partidos, com o CDS a rejeitar « revisitar heranças coloniais » e « deveres de reparação » e Rui Rocha, da Iniciativa Liberal, a considerar que quem declara ser obrigação de Portugal « indemnizar terceiros » pelo passado, está a atentar « contra os interesses do país ».

O líder do Chega, André Ventura, acusou Marcelo de trair os portugueses, enquanto, à esquerda, Mariana Mortágua do BE defendeu ser importante que Portugal faça um debate sobre o seu passado colonial e Paulo Raimundo do PCP considerou haver espaço para a cooperação com as antigas colónias.

Não foi a primeira vez que Marcelo Rebelo de Sousa sugeriu a reparação de crimes do passado.

Há um ano, na sessão de boas-vindas ao Presidente brasileiro Lula da Silva, que antecedeu a sessão solene comemorativa do 49.º aniversário do 25 de Abril na Assembleia da República, defendeu que Portugal devia um pedido de desculpa, mas acima de tudo devia assumir plenamente a responsabilidade pela exploração e pela escravatura no período colonial.

Durante mais de quatro séculos, pelo menos 12,5 milhões de africanos foram raptados, transportados à força para longas distâncias por navios e mercadores maioritariamente europeus e vendidos como escravos.

Alfa/ com Lusa

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