Tesouros de Notre-Dame salvos mas reconstrução vai dar debate

Principais obras de Notre-Dame foram salvas e a reconstrução vai ter dinheiro mas o debate vai ser aceso

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Alfa/Expresso. Por Daniel Ribeiro

A “floresta”, como era conhecido o imenso emaranhado de gigantescas vigas de madeira que suportava a cobertura do templo e o pináculo, ardeu quase toda e parte do telhado ruiu. Mas os principais tesouros e o altar principal foram salvos. Haverá dinheiro para obras, mas a reconstrução vai dar polémica

Nesta terça-feira, dia seguinte ao grande incêndio que durante 14 horas destruiu boa parte da Catedral de Notre-Dame de Paris, os franceses estão e efetuar autênticas peregrinações ao local. São milhares de pessoas e algumas parecem chocadas ou, no mínimo, muito comovidas.

“É como se viéssemos visitar uma pessoa da família gravemente ferida no hospital. Vimos ontem as terríveis imagens das chamas na televisão, foi incrível, quisemos ver por nós próprios e viemos dizer que adoramos Notre-Dame”, diz uma mulher de cerca de 40 anos, residente na periferia leste de Paris, que estava acompanhada por dois filhos, ainda crianças.

Como esta família, viam-se centenas e centenas de outras pessoas emocionadas ao fim da manhã desta terça-feira nas redondezas da Catedral.

No entanto, muitos destes compenetrados “peregrinos” dão já, apesar da dor que transmitem (a maioria é católica), a sua opinião sobre a reconstrução do edifício. Neste momento, já há centenas de milhões de euros prometidos para ajudar – a maior soma foi prometida por empresas de luxo ou do petróleo, mas também há milhares de franceses anónimos a prometerem donativos.

Quando se fala com os parisienses, percebe-se rapidamente que o tema da reconstrução não é fácil e vai certamente dar aceso debate. Num rápido inquérito do Expresso, na manhã desta terça-feira, junto à Notre-Dame e noutras zonas da capital, as opiniões dividem-se: uns defendem a reconstrução “tal e qual” como estava antes; outros a introdução de modernidade, “como no Museu do Louvre, com a sua pirâmide de vidro”; e há ainda quem proponha que a catedral seja mantida como está agora, depois do incêndio, e que seja construída uma outra, inteiramente nova, noutro local…

As autoridades ainda não chegaram a essa fase da discussão. Por agora, a sua atenção vira-se para a segurança das fundações e de toda a estrutura do monumento histórico, classificado Património Mundial. No local, bombeiros e especialistas em arquitetura ou da polícia científica investigam e passam tudo a pente fino.

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Sabe-se que a larga maioria dos tesouros do templo católico foi salva graças à coragem dos bombeiros, que entraram no interior do templo ao princípio da noite de segunda-feira, quando as chamas ainda estavam na máxima força. Preservaram desse modo sudários, relíquias (entre elas a venerável e famosa “coroa de espinhos” alegadamente usada por Jesus), cruzes, cálices, ouro, quadros, estátuas, obras de arte e outros objetos históricos e antigos de valor incalculável. Todos estão a ser armazenados na Câmara de Paris, segundo confirmou ao Expresso Hermano Sanches Ruivo, autarca luso-francês no município parisiense.

As chamas destruíram sobretudo a cobertura, o pináculo das traseiras e os seus suportes em madeira, a chamada “floresta”, um estonteante rendilhado de gigantescas vigas, na maioria de carvalho, que suportavam tudo.

Alguns vitrais e pinturas também foram destruídos, mas a famosa rosácea, à entrada, não.

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As paredes, tanto as laterais como as da fachada e das traseiras, bem como as torres, parecem manter-se sólidas. O altar principal e a sua famosa cruz de ouro também estão intactos.

As primeiras informações apontam para um acidente ligado às obras de restauro que foram recentemente lançadas na Notre-Dame (deveriam durar 20 anos) e que, na altura da eclosão do incêndio, estavam centralizadas na parte traseira na nave central e junto à histórica “torre-pináculo” que ardeu e ruiu. Será preciso mais algum tempo para conhecer as causas reais da catástrofe. Mas sabe-se que todas as enormes estátuas que se encontravam em redor do pináculo também foram salvas – tinham sido retiradas há alguns dias pela empresa responsável pelas obras.

A emoção que o drama provocou em França pôs o país a chorar e os católicos a rezar e a entoarem cânticos religiosos nas mais diversas ruas e praças. Mesmo muitos turistas estrangeiros choravam esta segunda-feira nesta zona junto ao rio Sena, a mais central de Paris.

Até políticos deixaram correr as lágrimas, como alguns deles sublinharam. “Chorámos todos”, disse ontem Anne Hidalgo, “maire” de Paris.

O incêndio parou tudo. Até a crise dos “coletes amarelos” ficou em suspenso e o Presidente Emmanuel Macron adiou a sua comunicação sobre o assunto, que estava programada para as 20 horas desta segunda-feira (menos uma hora em Portugal). Em vez disso, Macron falou da tragédia na Notre-Dame, que considerou o “epicentro” da vida francesa. “A Catedral vai ser reconstruída”, prometeu.

“É normal que tudo tenha parado, porque Notre-Dame de Paris não é apenas uma igreja para os católicos, é um centro de vida, um centro de cultura, um centro de convívio e um símbolo do que as mulheres e os homens fazem de mais belo”, diz Hermano Sanches Ruivo.

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