Covid-19: Oxfam identifica Brasil como « zona emergente » de fome extrema
O Brasil surge com esta classificação, juntamente com a Índia e a África do Sul, no relatório « O vírus da fome: como a covid-19 está a aumentar a fome num mundo faminto », da organização não-governamental Oxfam, que analisa os impactos da doença em países onde a situação alimentar e nutricional das populações era já extrema antes da pandemia.
De acordo com a ONG, a situação da pobreza e fome no Brasil começou a deteriorar-se em 2015 devido « à crise económica e a quatro anos de austeridade ».
« Até 2018, o número de pessoas que sofriam de fome no Brasil tinha aumentado em 100 mil para 5,2 milhões graças a um forte aumento da pobreza e do desemprego, e a cortes radicais nos orçamentos para a agricultura e a proteção social », refere-se no documento, que aponta os cortes no programa Bolsa-Família e, desde 2019, « um desmantelamento gradual » das políticas e instituições destinadas a combater a pobreza.
« A pandemia covid-19 foi agora acrescentada a esta mistura já tóxica, causando um rápido aumento da pobreza e da fome em todo o país. As medidas de distanciamento social introduzidas para conter a propagação do coronavírus e evitar o colapso do sistema de saúde pública agravaram a crise económica », acrescenta-se no estudo.
A ONG recorda que milhões dos trabalhadores mais pobres, que têm poucas economias ou benefícios, perderam empregos ou rendimentos, sem que tenham sido beneficiados por apoios governamentais.
« Até final de junho, o Governo federal distribuiu apenas 10% da ajuda financeira prometida aos trabalhadores e empresas, através do Programa de Apoio Emergencial ao Emprego (PESE), com as grandes empresas a obterem mais benefícios do Governo do que os trabalhadores ou micro e pequenas empresas », aponta a Oxfam.
Da mesma forma, apenas 47,9% dos fundos destinados à ajuda de emergência a pessoas vulneráveis tinham sido distribuídos até ao início de julho.
Por isso, a ONG entende que « o Governo federal está a falhar no apoio às pessoas mais vulneráveis do Brasil”.
De acordo com a Oxfam, a implementação do programa de Renda Básica de Emergência regista longos atrasos na resposta aos pedidos de ajuda, recusas injustificadas de ajuda, falta de telemóveis, ligações à internet e endereço de e-mail para se qualificar para a assistência.
Por outro lado, adianta a organização, « apenas três meses após o início do surto do coronavírus do país, e numa altura em que ainda está largamente fora de controlo, o Governo ameaça reduzir o pagamento dos benefícios ».
A Oxfam Brasil lançou uma campanha para apoiar 1.000 famílias vulneráveis em São Paulo, Rio de Janeiro e Recife através de transferências monetárias de 60 dólares (53 euros) por mês durante quatro meses, considerado o suficiente para garantir que as famílias possam comprar alimentos e outros bens essenciais.
A meta de arrecadação de fundos para este programa é de 240 mil dólares (211,8 mil euros).
O Brasil é o país lusófono mais afetado pela pandemia e um dos mais atingidos no mundo, ao contabilizar o segundo maior número de infetados e de mortos (mais de 1,71 milhões de casos e 67.964 óbitos), depois dos Estados Unidos.