Êxodo na Saúde – um trabalho do Expresso, por VERA LÚCIA ARREIGOSO. O ano deverá terminar com quase 400 pedidos para exercer no estrangeiro. A fuga de especialistas do SNS só foi maior em 2015
Mais médicos portugueses estão a emigrar
(Um artigo para ler na íntegra e na verão original, com mais fotos e entrevistas em expresso.pt, semanário versão digital ou na versão impressa do jornal)
Precisamos recuar até aos anos da crise em Portugal para somar tantos médicos a caminho de sistemas de saúde estrangeiros. Até ao final do ano, os pedidos de certificados para exercer medicina fora do país deverão ficar perto de 400, pouco menos do que o recorde de 475 registado em 2015. As razões de quem sai são variadas, mas há uma comum a todos: a degradação das condições de trabalho no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O prognóstico da emigração médica poderá vir até a ser o mais negativo de sempre. Entre janeiro e agosto deste ano, e sem incluir os dados da região Norte — solicitados e sem resposta —, tinham chegado à Ordem dos Médicos (OM) 253 pedidos, 230 só na delegação Sul. A manter-se a média mensal de 32 solicitações, 2019 terminará com 381 saídas, a que se juntarão outras no Norte, com um número expressivo de profissionais. Contas feitas, não será difícil ultrapassar o valor mais elevado de sempre, as 475 saídas em 2015.
As opções para trabalhar fora do país não faltam e vão ser ainda mais. A Comissão Europeia estima que no próximo ano a Europa terá uma carência de 230 mil médicos. Ou seja, 13,5% das necessidades assistenciais dos europeus estarão por assegurar. Por exemplo, o atual primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, já prometeu contratar seis mil médicos em 2020 caso seja reeleito. Entre os candidatos vão estar muitos portugueses, pois o Reino Unido tem sido um dos seus destinos de eleição.
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Entre os clínicos que informaram a Ordem sobre o local de destino, surgem outros países da União Europeia, como Alemanha, Irlanda, França ou Bélgica; mas também Suíça, Brasil, EUA, Canadá, Austrália ou até Suazilândia. Outro dado novo é que a emigração inclui agora profissionais em todas as fases da carreira, incluindo seniores com décadas de SNS.
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O expresso relata vários casos e as razões da escolha da emigração são sobretudo ligadas aos ritmos de trabalho e ao nível do salários. É o caso do médico Alberto de Sousa, que se instalou em França:
« Com 35 anos e especialista em medicina geral e familiar, Alberto de Sousa está em França desde 2015. Trabalhou num centro de saúde na área de Viseu depois de especializar-se e durante mais de um ano esperou para entrar no SNS. Acabou por ser levado para o estrangeiro. “Em França já tinha um contrato — há hospitais públicos a contratar empresas para recrutarem especialistas — e em Portugal ainda nem sequer tinha aberto o concurso.”
“Com o ritmo de trabalho que tinha em Portugal não iria chegar com saúde aos 65 anos: racionar exames, fazer consultas de 15 minutos, não ter carreira, assumir uma lista de 1900 doentes e pedir uma consulta de outra especialidade e ter de esperar meses. Em França, decido quantos dias por semana quero trabalhar e em diferentes estruturas, no caso em regime livre como médico de família e a coordenar cinco lares da comunidade intermunicipal”, explica.
O salário também é outro. “Um médico ganha dois mil euros líquidos no início da carreira numa área urbana e cinco mil numa região carenciada, tendo isenção fiscal durante cinco anos. Em regime livre, como aqui funciona a medicina geral e familiar, trabalham-se quatro dias, veem-se 30 doentes e a remuneração ronda sete mil euros líquidos.” O médico conhece colegas portugueses em todo o mundo e muitos em França, como uma antiga diretora de anestesiologia da Maternidade Alfredo da Costa, Lisboa. “É grave quando também saem seniores.”
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