“Não sou extremista, sou equilibrado, até a Fátima fui”. Quem é Jérôme Rodrigues

“Família portuguesa era católica, a francesa era mais comunista. Não sou extremista, sou equilibrado, até a Fátima fui… não sou concretamente católico, mas sou batizado, há um equilíbrio nisto tudo, sou uma pessoa aberta”  Quem é o luso-francês que faz tremer Emmanuel Macron.

Alfa/Expresso. Adaptação – Por Daniel Ribeiro (Leia artigo completo no Expresso-Diário de segunda, 28/3)

Jérôme Rodrigues, atingido por um disparo, no sábado à tarde, na praça da Bastilha, em Paris, quando filmava, de cara destapada e com um telemóvel, uma manifestação do movimento, falou esta segunda-feira com o Expresso, no hospital onde foi operado durante cinco horas ao olho direito. Militante ‘colete amarelo’ desde a primeira hora, diz que não é um radical. “A família portuguesa era católica, a francesa era mais comunista. Não sou um extremista nem um vândalo, de modo nenhum”.

Quando recebeu o Expresso, ao fim da manhã desta segunda-feira, Jérôme Rodrigues já tinha dado, desde domingo, diversas entrevistas no hospital. Mesmo antes de ser uma das 18 vítimas atingidas nos olhos por disparos da polícia, o barbudo luso-francês já era muito conhecido em França. Era um dos rostos da fação França Em Cólera, uma das mais fortes e mais bem organizadas do movimento dos ‘coletes amarelos’, que nasceu na internet há cerca de três meses.

Jérôme era um “habitué” de todas as manifestações (onze sábados seguidos) e também dos debates que há várias semanas se têm multiplicado nos estúdios das TV francesas.

Nas entrevistas, no hospital, acusou a polícia de o ter visado pessoalmente. Ao Expresso repetiu o mesmo. Era conhecido e, neste sábado, andava de colete amarelo e de cara destapada na linha da frente, a filmar os confrontos com o telemóvel e a transmiti-los em direto nas redes sociais, bem como a tentar convencer alguns camaradas a saírem dos locais mais perigosos. “Eu não sou um ‘casseur’, nem um vândalo, ando sempre de cara destapada!”.

Depois de ter sido ferido, apresentou queixa em tribunal contra a polícia, o Governo e o Presidente Emmanuel Macron. É politicamente radical, mas não apela à violência. “Sou pacifista, quem provoca esta violência nem sequer é a polícia, é o Governo e o Presidente, que não páram de nos chamar extremistas!”, exclama.

No entanto, queira ou não, Jérôme está no olho do furacão da batalha política em França, designadamente da polémica sobre a utilização pela polícia de armamento comprovadamente perigoso, proibido noutros países europeus. E o seu caso já levou alguns políticos a pedir a demissão do ministro do Interior, Cristophe Castaner.

Ao Expresso fala espontaneamente em português, à frente de seis repórteres franceses e outros estrangeiros. “Sou um português de origem”, explica-lhes.

“O meu pai veio para França em 1978, por amor. Apaixonou-se pela minha mãe, francesa, que tinha ido de férias a Portugal e … foi assim”, diz. “Agora já voltaram para Portugal, vive-se melhor lá”, acrescenta.

O pai é de Celas (Coimbra) e Jérôme nasceu em França, há 39 anos, em Montreuil, na periferia leste de Paris (no complicado departamento 93, principal palco da revolta das periferias em 2005 – “na altura era tudo pacífico, tudo funcionava calmamente entre os habitantes, não é como agora”, informa).

“VIVE-SE MELHOR EM PORTUGAL”

Conviveu desde pequeno com pessoas de todas as origens, raças, religiões e culturas, trabalhou na Eurodisney e no Club Méditeranée, depois no comércio e, hoje, é canalizador. “Sou uma pessoa aberta, pacífica, não sou extremista, de modo nenhum!”, explica.

“Da família portuguesa recebi uma educação católica, da francesa um pouco mais comunista”, diz ao Expresso. “Por isso sou equilibrado, fui a Fátima e tudo, não sou concretamente católico, mas sou batizado, há um equilíbrio nisto tudo, sou uma pessoa aberta”.

Não nasceu em Portugal, mas fala português com alguma fluência. “O meu pai queria que eu aprendesse português, estudei quando era criança às quartas-feiras à tarde (ensino da ‘língua de origem’ para os filhos de emigrantes quando os estudantes franceses descansavam)”.

Jérôme não tem dupla nacionalidade porque, diz, “a papelada é complicada no consulado”.

Mas este ‘colete amarelo’ adora Portugal. À frente de todos os jornalistas presentes no hospital onde está em convalescença afirmou, em francês: “A França deveria inspirar-se em Portugal, onde por exemplo os velhos vivem melhor. Portugal é um país onde as pessoas vivem mais felizes. Em Miranda do Corvo, onde os meus pais residem, até o Presidente da República toma banho num rio sem segurança nenhuma à volta dele, Portugal interessa-me muito e o Governo até dá incentivos para o regresso dos emigrantes, Portugal é um eixo do progresso!”.

Quanto à política francesa, na qual hoje é um importante protagonista, diz que não lhe interessa. “Envolvi-me no movimento dos ‘coletes’ porque há muitos anos o esperava, mas não quero ser político, nem vou participar no Debate Nacional lançado pelo Presidente Macron, porque é fumo para os olhos”. “Eu luto pelo fim dos privilégios!”, conclui.

Quando foi ferido, Jérôme filmava a manifestação na Bastilha, neste sábado à tarde, porque é militante dos ‘coletes’ e porque adora filmar. “Tenho muitos filmes de Portugal, vou lá sempre!”, exclama.

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