Governo aconselha portugueses a “viajar com passaporte válido” para o Reino Unido já a partir de 1 de novembro
Em causa estão as incertezas provocadas pelas últimas declarações do Governo britânico, que quer pôr um fim à livre circulação logo à meia-noite do dia 1 de novembro (primeiro dia do Brexit) se não for assinado nenhum acordo de saída
Faltam dois meses para o fim o prazo estabelecido para que o Reino Unido consiga um acordo com a União Europeia para uma saída ordeira. Pelas 23h59 de 31 de outubro, e caso não exista consenso, o país vai retirar-se do espaço europeu sem qualquer ligação ao bloco e isso terá consequências diretas na forma como as pessoas se deslocam do e para o Reino Unido. Com essas incertezas em mente, o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) diz ao Expresso que “será recomendável que os cidadãos portugueses viajem na posse de passaporte válido” depois do dia marcado para a saída.
As garantias públicas que vêm sendo dadas pelo governo britânico, porém, incluem a possibilidade de que os europeus que possuam cartão de cidadão continuem a poder utilizá-lo para entrar no Reino Unido, durante um período temporário a determinar, após a saída do Reino Unido da UE. “Não obstante, dadas as atuais incertezas em torno das medidas que poderão vir a ser implementadas na prática pelas autoridades britânicas – e ao facto de não ser aqui possível reciprocidade, dado que os cidadãos britânicos não possuem cartão de identificação nacional -, será recomendável que os cidadãos portugueses viagem na posse de passaporte válido”, avança ao Expresso o MNE, em respostas enviadas por email.
As dúvidas aumentaram segunda-feira, depois de Boris Johnson, primeiro-ministro britânico, e da sua ministra do Interior, Priti Patel, terem confirmado o “fim imediato da livre circulação” logo no dia 31 de outubro. A chuva de críticas não tardou, com vários analistas a sublinharem a impossibilidade de o governo britânico cumprir essa promessa, já que, em primeiro lugar, ainda não resolveu a questão de como distinguir entre aqueles que já estavam no Reino Unido antes do Brexit e aqueles que entrarão no país após 31 de outubro, e, em segundo, porque as autoridades britânicas não vão conseguir registar todos os cidadãos da UE já a residir no Reino Unido até nessa data.
AEROPORTOS EM MODIFICAÇÃO POR CAUSA DO BREXIT
A 17 de janeiro deste ano os jornais portugueses noticiavam que o Governo « vai criar um corredor para cidadãos britânicos nos dois aeroportos que mais recebem turistas do Reino Unido: o de Faro e o do Funchal, tal como existe para os cidadãos da UE e dos países da CPLP ». O Expresso perguntou ao MNE se este plano se mantém, mesmo se a saída sem acordo desencadear um fecho de fronteiras bruscas aos cidadãos portugueses que queiram entrar no Reino Unido, o que foi confirmado. “A ANA está a proceder à adaptação dos postos de chegada nos aeroportos, o que permitirá ao SEF aumentar a capacidade de controlo de passageiros, considerando precisamente a necessidade de controlo de passageiros britânicos a partir do Brexit.”
NECESSIDADE DE REGISTO DE RESIDÊNCIA É “PRIORIDADE” DAS AUTORIDADES PORTUGUESAS NO REINO UNIDO
“Desde junho de 2016, conhecido o resultado do referendo britânico, que Portugal tem alertado os nacionais residentes no Reino Unido para a necessidade de regularizarem a sua situação”, reforça o Governo. As estimativas colocam o número de europeus residentes no Reino Unido para lá dos três milhões, e apenas um terço dessas pessoas já pediram o seu estatuto de residente permanente (aquilo a que as autoridades britânicas chamam “settled status”).
Segundo dados enviados pelo Ministério do Interior ao Governo português, até 31 de julho deste ano 92.900 cidadãos portugueses residentes no Reino Unido já se tinham candidatado a este estatuto, não sendo conhecido o número de sucessos. Os últimos números do Governo britânico (2018) colocam o número de portugueses nos 224.000, mas o número de pessoas residentes do Reino Unido com nacionalidade portuguesa pode ultrapassar os 300.000, devido à presença de muitos cidadãos angolanos e brasileiros que têm direito a passaporte português, quer devido à sua ascendência, quer por terem nascido (ou os seus pais), no caso de Angola, quando este país ainda era oficialmente parte do território português.
Sobre a crescente vaga de pedidos de esclarecimento de dúvidas sobre o que acontecerá após dia 31 de outubro, o Governo sublinha que reforçou o atendimento consular. “Em 2018 realizaram-se um total de 22 sessões exclusivamente dedicadas a prestar esclarecimentos sobre o processo do Brexit e foi também reforçado o número de permanências consulares que permitem o atendimento aos cidadãos de forma descentralizada. Em 2018 realizaram-se 82 dias de atendimento desta natureza e para este ano estão previstos 128 dias de atendimento por esta via”, diz o Governo. Estas permanências consulares abrangem Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte, País de Gales, mas também Bermudas, Ilha de Man e Ilha de Jersey.
Em abril deste ano entrou em funcionamento o Centro de Atendimento Consular dedicado ao Reino Unido, que funciona em Lisboa e proporciona o esclarecimento de dúvidas sobre o Brexit, mas também permite o agendamento de atendimentos para a realização de atos consulares nos consulados de Londres e de Manchester. Um serviço bastante concorrido, segundo números do Governo: “Entre abril e julho, este serviço atendeu 22.268 chamadas, das quais 10.459 eram pedidos de informação e 11.799 para efeitos de agendamento de atendimentos. Foram ainda respondidas 13.675 mensagens de correio eletrónico enviadas por cidadãos portugueses para este serviço”.
O email enviado ao Expresso pelo MNE esclarece ainda que todas as regras que possam vir a aplicar-se depois da saída do Reino Unido da União Europeia só vão afetar eventuais novos migrantes.